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segunda-feira, 5 de março de 2012

Ainda um pouco mais sobre bullying

Bullying é um tema controverso, polêmico e atual, tanto é que fui convidado pelo pessoal do Papo de Gordo para gravar um podcast sobre bullying! A conversa foi muito bacana e foi muito bem recebida. Porém, como todo papo polêmico, teve bastantes controversas. Caso queira ouvir o cast original, sigam este link. E neste, vocês poderão acessar o episódio onde foi lido alguns comentários sobre o episódio de Bullying.

Como toda boa conversa, esse cast sobre bullying rendeu muita conversa e repercussão… Esperava que fossem repercussões positivas e criativas, mas infelizmente percebo que houve mais desinformação do que diversão. Só lembrando que, por mais que o tema do cast seja sério, a proposta sempre foi ver as coisas por um lado mais leve – ao menos a minha proposta ao participar do programa era mostrar que, por mais sério que seja um problema, podemos aprender a ver as coisas por outros ângulos.

Como toda conversa de bar, é impossível aprofundar qualquer questão num programa como esses. Muitas opiniões são lançadas, piadas são feitas, e o foco é perdido invariavelmente. Quem quer levar as coisas muito à sério acaba perdendo o ritmo com essa dinâmica, então a informação séria e profunda também acaba sendo prejudicada.

Como muito bem foi comentado várias vezes, ninguém apóia o bullying. O comentário “na minha época, bullying era formador de caráter” fazia referência a muitas coisas, inclusive ao fato de que hoje em dia, não sabemos transformar eventos negativos como o bullying em oportunidades de crescimento pessoal, não sabemos lidar com frustrações, somente com questões imediatas e com o mínimo de sofrimento possível. Infelizmente, o que a midia, os comerciais e os filmes vendem que a vida deveria ser não é como a vida realmente é. E, sempre que possível, temos que aprender a lidar com adversidades.


Uma questão que temos que perceber é que nossa cultura tende a sempre tomar o lado da vítima e não tenta compreender o quadro todo. Ao falar sobre bullying e sobre como lidar com isso, invariavelmente nos identificamos com aqueles que sofrem e queremos nos livrar daqueles que nos fazem sofrer. Então, por mais que queiramos ver diferentes lados, já temos o nosso e nos fechamos para o diferente: a vítima sempre tem razão e o bully está sempre errado.

O mais interessante é que todos acham que sua opinião baseada em opiniões e expeculações são a mais legitima verdade! Não importa se um especialista na área diz que o problema é mais embaixo, que a questão não é o bullying em si mas sim as relações familiares e os problemas entre pais e filhos: todos queremos ver os bullies serem apederjados e festejam com o Menino Zangief por ele ter revidado às agressões. E, sem perceber, nos tornamos iguais àqueles bullies que queremos apedrejar e valorizamos quando a violência que queremos abolir se torna nossa prática cotidiana.

Recebi um comentário em meu blog de um ouvinte do Papo de Gordo falando das “besteiras” que me ouviu falar no programa. Além disso, disse que dez meses de remédios psiquiátricos o ajudaram infinitamente mais que cinco anos de terapia com três psicólogos diferentes. É tão engraçado ver como a nossa cultura do imediatismo é tão mais valorizada do que o trabalho, a construção e a paciência! Aposto que esses cinco anos de terapia fizeram uma boa diferença na vida desse ouvinte e o remédio foi só um catalizador que trabalhou com o problema aparente.

Provavelmente ele não sabe – como a maioria da população leiga no assunto não tem como saber – mas os remédios psiquiátricos lidam com a parte do problema que está aparente, nunca com as questões internas desse problema. Se o remédio fosse para tratar icebergs, eles tratariam unicamente a ponta dele, da parte visível, nunca o que está na profundidade e que sustenta toda a ponta. Se lidamos com o bullying da mesma forma, como a maioria parece querer, evitamos olhar para questões que realmente são importantes, como o papel que os pais e professores têm na educação dos filhos, qual a influênica da mídia e dos meios de comunicação na formação dos valores sociais e qual é o espaço disponível em nossa sociedade politicamente correta para vivermos instintos básicos, necessários e negligenciados como a violência, a agressividade, a frustração e o sofrimento de forma positiva e criativa? Por mais que queiramos ignorar, todas essas – e outras tantas – questões estão sim relacionadas à temática do bullying e não podem ser ignoradas ou ter sua importâncias diminuída diante das perversidades que são relatadas e experienciadas nas agressões escolares todos os dias.

O bullying, como o problema tratado pelo remédio desse ouvinte, é só a ponta do iceberg. Existe muito mais coisas escondidas e que não podem ser ignoradas, por mais que nós insistentemente as ignoremos. Se continuarmos levando questões como o bullying – que é só um sintoma da nossa cultura, uma consequência aparente de algo mais sério e esquecido – como se fosse o único ou principal problema, ignoraremos todas as outras questões mais sérias e profundas, pois elas ficarão escondidas diante da nossa fúria contra a bagunça que a destruição das aparências faz. Se aparentemente não temos mais problemas, será que eles realmente sumiram? A resposta é clara: os problemas só vão sumir quando eles forem completamente trabalhados e não só escondidos ou tapados com ações paliativas ou remédios psicotrópicos.


Infelizmente, nossa cultura prefere só se enganar com aparências melhores e ignorar os problemas mais sérios que ficam escondidos. Enquanto formos assim, sempre haverão pessoas que vão reclamar do humor diante da seriedade, que vão achar besteira nos preocuparmos com questões sociais quando aparentemente o problema é pessoal e que não vão compreender as sutilezas das entrelinhas, pois querem tudo explícito e na hora. O problema é sim mais embaixo e precisamos revisar as nossas posturas e prioridades antes de querer apontar dedos e condenar os culpados.

O bullying na verdade não é um problema de crianças e escolares: ele nos mostra que existem outros problemas muito mais sérios e ignorados de toda a nossa sociedade. O lado mais fraco dessa relação, as nossas crianças nas escolas, é quem acaba sofrendo por nossa postura de mascarar tudo atrás da imposição do politicamente correto. Enquanto não olharmos para nós mesmos e quais são os nossos reais valores pessoais diante da agressividade, do sofrimento e de todos os outros instintos naturais humanos, o problema do bullying nunca vai ser resolvido.

A pergunta que deixo, então é: qual é o seu papel nisso tudo, de vítima que só reclama do mundo e dos outros, de agressor que só ataca os mais fracos ou aqueles que são ou pensam diferente ou não são compreendidos, ou de agente de transformação que realmente quer deixar as diferenças de lado e fazer algo de util para mudar a sociedade?


Pablo de Assis
Psicologo, pesquisador e psicoterapeuta junguiano. Trabalha com psicoterapia de adolescentes e adultos e tem MBA em Gestão de Recursos Humanos, experiência na área de tecnologia educacional, podcasting e tecnologia em geral. Para entrar em contato, enviem emails para pablo@deassis.net.br.





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