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sexta-feira, 10 de junho de 2011

Essência resgatada

Como a educação, no âmbito escolar e em conjunto com os pais, pode trazer de volta a autoestima de uma criança e ser uma ponte entre o respeito a si própria e ao outro, além de ser uma arma contra o bullying?

 

 

Essência. Uma palavra tão profunda e ao mesmo tempo tão significante em seu sentido mais literal. É o ser e o estar. Verbos importantes, principalmente quando ajudam a resgatar a funcionalidade do verbo educar. Mas, em um mundo onde o ter aflora nos nervos mais afoitos, a essência – tão inveterada – fica tão rala quanto a mais superficial promessa não cumprida, o que não passa de palavra morta. E quando trata-se de educação, então, a essência torna-se necessidade. Porque este é o outro lado do respeito; o outro nome da existência. E um dos pilares da edificação que forma humanos em pessoas, alunos em cidadãos. Sim, porque se todos os dias meninos e meninas desprezam os seus pares pelo reles motivo que o diferente incomoda, é um motivo e tanto a se considerar que a construção da cidadania está manca, defeituosa e pronta para despencar.

Foi o que aconteceu com a menina Renata Fratin Aos sete anos, a descendente de japoneses possuía ‘um grande defeito’. Apesar de ser mínima na idade, já sabe que uma das piores formas de câncer não é a célula maligna que se prolifera no organismo, mas o comodismo que dilacera o senso crítico da massa – a trágica sensação de bem estar que seduz a humanidade e cospe fora o sentido literal de se educar.

Na sala de aula, Renata questionava o barulho dos demais alunos, a gritaria que a impedia de voar no saber. Acostumada à disciplina nipônica, a menina não se contentava em dividir sua atenção com a bagunça alheia. E isso incomodou. Num país onde crianças são passadas para séries mais adiantadas sem saber o que estão lendo, ‘não’ é natural uma criança questionar, perguntar, cobrar pelo certo, quando o errado já está incutado. Infelizmente, esta foi a primeira impressão de Renata da escola pública. O que poderia ser referência de ensino, tal qual acontece nos países desenvolvidos, retratava a opressão para a menina. A cobrança veio da mãe, Telma Sayuri, que esperava respostas dignas e concretas da direção. Isso é normal, acontece em qualquer escola, foi o que lhe responderam, porém.
No segundo dia de aula, Renata andava pelo corredor da escola, quando foi empurrada pelos outros coleguinhas – também crianças, é bom ressaltar – inconformados pela ousadia da garota em querer apenas estudar com atenção. Por aí, aos poucos, a pequena e comunicativa Renata estava perdendo a palavra, a essência. Já andava triste e arranjando desculpas em casa para se livrar da liberdade sem limites. Não dela, porque, em casa, Telma ressalta a necessidade do limite, da educação e da disciplina. Mas da escola, onde deveria ser um instrumento que transforma vidas e estudantes em cidadãos. E dessa fuga surgiu uma presa fácil para o bullying.

Descendo as escadas, alguns dias depois, Renata foi empurrada pelas costas. Um ato tão covarde para a vítima quanto cruel para o próprio agressor. Porque, se o bullying existe, há além de uma vítima que requer cuidados, um agressor que pede atenção. E ambos imploram pela volta à essência, seja da autoestima, seja da noção, por menor que possa ser, de respeito.

Mas, como alcançar o foco do problema se marginalizada está a essência da educação? Como exterminar o mal chamado bullying, se a violência também chega ao professor? E se todos, neste contexto de público, sofrem a falta de recursos, as janelas vazadas, as portas quebradas, as goteiras insistentes? E se em casa a criança sofre pela falta de boa referência e limites para tudo?

Infelizmente, foi essa morte silenciosa da escola pública que fez Telma tirar a filha de lá. Procurava um local que, além de dar conhecimento, desse apoio cívico, formação cidadã, educação pessoal, respeito ao outro. O que deveria haver em qualquer instituição de ensino.

Foi então que Telma encontrou o colégio Gerar. E ali a menina Renata encontrou-se novamente. Um nome propício para quem dá autonomia, em especial ao professor, que sabe a hora de abraçar e chamar atenção. Que ensina e, principalmente, educa para a vida.

Kelly Ferreira, a professora, mostra o caderno escrito “eu te amo” por um dos alunos. Uma declaração feita a alguém que escolheu trilhar por uma estrada difícil. Mas é isso que a faz realizada. É dar a uma aluna, como Renata, a liberdade de questionar o quanto quiser. É desmistificar que a violência em ambiente escolar é normal. É trazer à tona o belo das crianças, quando nem elas mesmas têm idade para reconhecer a verdadeira amizade que pode existir entre elas. E tudo isso graças ao limite, à dedicação em resgatar a essência de cada um, impondo demarcações úteis entre o querer e o poder de cada aluno. Mas houve quem lhe criticasse em outras instituições. E foi por isso que resolveu dedicar-se a quem lhe desse valor pela devoção de ensinar. Crianças têm que ter regras, ela destaca. E é uma motivação, especialmente, por eles (os alunos), acreditarem nela. Por eles, ela importa-se em ressaltar. Porque são eles que lhe dão força na hora da fraqueza e da dificuldade em ensinar.

Um dia, ela conta, chamaram um aluno de orelhudo. A turma, então, já educada a amar a todos os colegas da forma como são, em coro dizia que ele era bonito. Foi o momento de transformação do ‘feio’ em belo. De retomar a autoestima perdida. O fantástico resgate da alma, da essência do ser, do valor, que, quando crianças, chega a ser tão fugaz, muito mais pela falta de importância que muitos pais dão a este aspecto. Isso é a boa sensação de que estamos perto um do outro; de que existe alguém que nos acolhe, ela explica. Até porque se faltam perspectivas, se o olhar se fecha, é impossível perceber outras possibilidades, alcançar o futuro.

Nas salas de aula, os combinados ditam as regras. E trabalhar em silêncio e sem incomodar é o primeiro código para as crianças compreenderem a noção de limite. Desta forma, Renata sentiu-se em casa. Melhor para ela. Pior para os milhares de estudantes da rede pública, que convivem com a falta de apoio em todos os sentidos e um senso de libertinagem que enruga as possibilidades de sonhos realizados. Pela ausência de não e fartura de dificuldades no âmbito escolar que sobrecarrega professores, pais e alunos.

É por isso que é importante saber como está a cabeça do aluno para que ele saia da escola da melhor maneira possível; para que ele entre um e seja devolvido aos seus pais de outra forma. Porque se os filhos estão bem, os pais vão estar bem, compreende Gilson Tomaiz, o coordenador administrativo do colégio.

Telma vai além quando diz que a necessidade real é de formar crianças com opinião. E desacostumar a sociedade da violência impregnada, do efeito cascata que, quem sabe, tenha começado com uma semente de bullying plantada lá atrás e hoje desabrocha em dor desatinada.
Fonte:
http://www.arcauniversal.com/comportamento/noticias/essencia_resgatada-5637.html

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