A tragédia recente da escola Realengo no Rio chama a atenção para um problema médico e social muito importante – as doenças psiquiátricas – mais precisamente a esquizofrenia. Trata-se de uma patologia que depende da interação entre os genes e o ambiente, mas cuja influência genética é indiscutível. Acredita-se que Wellington Menezes de Oliveira, o assassino, era esquizofrênico. Nesse caso, o bullying que ele teria sofrido poderia ser o efeito ambiental desencadeador. É importante deixar claro, porém, que embora traumático o bullying sozinho não torna ninguém um frio assassino.
Recordando
A esquizofrenia é uma doença neurológica com uma herança complexa, cuja herdabilidade ou contribuição genética é de 80 a 85%. Estudos em esquizofrênicos já falecidos revelaram que seus cérebro têm volume diminuído e outras alterações patológicas, mas as células neuronais que são especificamente comprometidas e os mecanismos moleculares responsáveis pelo desenvolvimento da esquizofrenia ainda são desconhecidos. Como os sintomas em geral não aparecem antes da segunda ou terceira décadas de vida, o único meio de estudar células neuronais desses pacientes é através de células reprogramadas, as famosas iPS .
Como células-tronco (CT) podem contribuir no estudo da esquizofrenia?
CTs obtidas de pacientes têm se mostrado cada vez mais importantes para desvendar mecanismos genéticos que causam doenças – como é o caso da esquizofrenia. Já falei disso em colunas anteriores ( Células-tronco ajudam a entender o palato fendido e Células-tronco: ensinado a tratar doenças)
É o que mostra agora uma pesquisa que acaba de ser publicada na revista Nature por um grupo americano.
Foram estudados quatro pacientes
Os pesquisadores obtiveram fibroblastos (células da pele) de quatro pacientes esquizofrênicos com idades comparáveis (entre 22 e 27 anos). O primeiro havia sido diagnosticado com 6 anos e os outros três tinham história familiar de esquizofrenia. Esses fibroblastos foram reprogramados para depois geraram neurônios. Os cientistas observaram então que os neurônios dos pacientes mostravam uma conectividade reduzida além de um número diminuído de neurites – ou projeções dos neurônios. Além disso, a expressão de proteínas como a PSD-95 ou o receptor de glutamato estavam diminuídos e havia alteração de várias vias de sinalização associadas ao funcionamento neuronal do cérebro.
Uma droga já mostrou efeito nas culturas
Mas o mais interessante é que quando os autores adicionaram às culturas de neurônios uma droga antipsicótica chamada loxapina, que é usada no tratamento clínico dos pacientes, houve aumento na expressão de algumas proteínas que estavam diminuídas. Essa observação demonstra a grande importância de obter-se células-tronco e linhagens celulares de pacientes afetados por doenças genéticas. Elas permitem estudar o efeito de diferentes drogas diretamente nas células visando futuros tratamentos.
Provavelmente há muitos genes envolvidos
Essa pesquisa está de acordo com a hipótese segundo a qual a esquizofrenia poderia ser causada por diferentes combinações de genes alterados que levariam a um mau funcionamento dos circuitos neuronais. Por um lado, isso explicaria a alta incidência dessa doença em todas as populações. Pelo outro, se isso for verdade, procurar genes responsáveis por essa patologia pode ser uma perda de tempo. Melhor atuar diretamente nas vias alteradas e nesse sentido as células-tronco obtidas de pacientes poderão, mais uma vez, dar informações valiosas.
Por Mayana Zatz: Uma das maiores geneticistas do país
Fonte: http://veja.abril.com.br/blog/genetica/sem-categoria/esquizofrenia-bullying-e-celulas-tronco/
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